São vários, os boêmios. Cada um tem seu tipo, mas são todos iguais. Iguais pelo menos no amor pela noite, na companhia da cachaça, nos jogos de azar e na divisão da fumaça. Todo boteco tem um dono, também quase sempre um patuscão, que conhece bem a freguesia e lida à força, e não com educação. Sempre tem um dormindo na mesa de canto, enquanto outro lhe tira a carteira, com a maior cara de santo. Ele dorme pois não agüenta mais o gole, não tem mais dinheiro, nem mais jeito de alimentar sua prole. Enquanto um galã xaveca uma mulher honesta, outro, cambaleando, é tirado pela porta. Para ele acabou a festa. Quem sabe beber, sabe, quem não sabe, não se comporta. E é por isso que aquele dorme. É por isso que quem der bobeira some. Metade não paga a conta, outra metade faz o que pode, e é só a terceira metade que realmente consegue patrocinar o pagode. Mulheres vão à caça vestidas de carneiro, e o lobo sai pagando por tudo, todo faceiro. O artista do submundo se expressa, mas sem aplausos, só é musica de fundo. A cada nota torta do violão uma palavra grossa de mais alguém que foi ao chão. Um sobe sobre a mesa e leva um tapa. Já é de manhã e alguém sai à comprar pão, outro acaba cerveja, mas é cedo, e pede outra lata. Três amigos conversam, dois amigos apostam, um sozinho fica de olho, e dois inimigos se arriscam. Garrafada pra todo lado. Fim da noite com briga. Fim da noite, nossa amiga. Quebram uma mesa, e os copos são vários. Um puxa o gatilho, e corpos, esses também são vários...
quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011
Personagens num bar
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
E assim, Tadeu...
- Vai querida, respira, comigo, vamos!
Ela:
- AHHHH, que doooor, assim eu não agüento, não quero mais, eu não consigo!
- Não pode ser assim, “agora não brinco mais”, agora não tem jeito.
- Dói muito! Não dá! Não vai passar!
- Meu amor, você consegue sim, empurra, comigo, no três; Um.
- Fácil falar né seu inútil, ta aí só olhando.
- Dois...
- Pare de contar seu bosta, não está ajudando!
- Três! Empurra!
- Vou te empurrar pra fora dessa sala! O obstetra nem chegou ainda!
- Amor, eu to nervoso, ok?
- Eu estou com um ser vindo de dentro de mim me rasgando de baixo pra cima, e o senhor está nevosinho? Aff, por favor... AAAAAHHH!
- Essas contrações são de matar – ela ofegando fortemente.
- Tem algo que eu possa fazer para ajudar?
- CALA A BOCA E CHAMA A ENFERMEIRA!
- Nossa... então é assim... depois reclama que eu não colaboro...
- Aaaaaaaaaaaiiiiii!!! Meu Deus, o que é isso?! ai ai ai ai... ta vindo, chama lá, CHAMA LÁ PORRA!!!!
- Uau, nunca vi você falando assim enh... o que uma barriguinha não faz...
- AAAAAAAAAAAHHHH!!
- Ta bom, ta bom, pelo jeito está doendo, já entendi, saquei, não sou tão tapado assim só porque sou homem, tá? Vou lá chamar...
Um Doutor correndo no corredor com cheiro de malte e olhos baixos:
- Sim, o que foi? Hic (soluço).
Ele:
- Doutor, minha mulher está tendo um bebê, acho que está vindo, precisamos do senhor.
- Senhor está no céu meu filho, hic, eu to aqui no chão mesmo e meu horário já terminou, hic, até mais...
- Mas eu não sei o que fazer! Ela está lá gritando de dor.
- Hic, todas gritam... hic... é só o que sabem fazer. A minha mulher estava gritando comigo agora mesmo no telefone.
- DOUTOR! Estou falando sério, ela está em trabalho de parto!
- Hic, sim, sim, elas são um parto... quer um trago? Hic – virando mais um gole.
- Não, obrigado.
- É 12 anos... vai te relaxar... hic....
- Sério? Aceito então! – ele toma um trago.
15 minutos e várias doses depois... ele, entrando na sala:
- Amoooor, hic, olha quem eu achei no corredooooor! Dr. Roberto! O cara é muuuito gente fina.
- Ricardo, você está BÊBADO, seu desgraçado?!
- Nããão, claro que não, amor... hic... – ele virá para o médico e diz sussurrando, porém em voz alta:
- Ixi doutor, acho que ela sacou... hic...
- É filho, essa sua aí é esperta... mas sabe, você é um cara da paz, te considero muito!
- Ôô doutor, eu também! Temos que marcar um bar aí um dia, de repente jogar um futebolzinho...
Ela interrompe:
- ALOOOOU! Eu to tendo um filho aqui!!! Dá licença?? AAAAH!
- Ah, sim, claro, filho, chame a enfermeira ruiva ali para mim, sim?
- Hic, ruiva?
- Sim, a loira é cheia de não me toque, hic. – o médico vira para a mamãe - Então Sra., parece que vamos ter uma criança aqui! Hic...
Entre contratempos e soluços, a criança vem à luz, e a mãe suada e exaurida a recebe no colo:
- Ai meu Deus, obrigado, ele é tão lindo! Ainda bem que não parece com o pai!
- Como assim querida? Deixe-me ver, hic. Ah, mas é bonitinho mesmo, não é?
- BONITINHO???
- Quero dizer, é a coisa mais linda que, hic, eu já vi! Viu aqui doutor? Meu piazão? Esse aqui vai ser pegador! Ó o tamanho da ferramenta aqui! Puxou o pai!
- Ricardo, cala a boca... como assim “coisa” mais linda? Seu inútil. E se puxar essa merreca aí, é melhor ser rico, senão aí sim vai acabar que nem o pai...
- Ei, não precisa, hic, ofender não...
Indignada com a situação e espumando de raiva ela decide:
- Eu vou escolher o nome!
- Ei, mas a gente já não tinha escolhido Carlos? Carlos é uma boa, hic, não é “dóc”?
Doutor:
- Sim, eu gosto...
Ela:
- Não, você escolheu Carlos, eu quero Lucas.
- Aaah não, querida, nome bíblico não...
- Por que, qual o problema?
- Não quero, não gosto, não vou chamar, você vai chamar, hic, sozinha. Só você...
- Então será Rafael!
- Ah amor, mas aí quando ele for pequenininho vão ficar falando, hic, Rafael cara de pastel, crianças odeiam isso, você sabe.
- Ah, mas que coisa mais besta, Ricardo!
- Não querida, eu não vou chamar de Rafael. Hic...
13 nomes depois, discussão e mais uns soluços ébrios. Ela se cansa:
- Tá, deu então! Pra mim chega. Depois a gente vê isso, quando você estiver sóbrio.
- Tá, deu?
- Isso, chega!
- Tadeu é bom.
- Chega Ricardo, quero acabar a discussão.
- Não, não, querida, Tadeu é um bom nome, meu tio avô era Tadeu, eu gostava muito dele, ele me dava uns biscoitos que...
- O quê? Do que você está falando?
- Ueh, você não sugeriu Tadeu? Eu gostei, fica esse.
- Hã?
- Você acabou de falar, mulher! “Tadeu e chega”.
- Meu Senhor, Ricardo, como você é IMBECIL! Mas... sabe... gostei de Tadeu! =D
E assim, Tadeu...
domingo, 6 de fevereiro de 2011
Esqueça
sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011
Sobre um Sonho
Eu tive um sonho, e dele não quis acordar. Mas acordei. E é aí que reside toda minha frustração. Não no sonhar, mas no despertar. Assim como não lhe faz mal a vivência, mas a impotência que nos recolhe ver ela passar. Aquele tempo todo e aquela vida que construí, todo aquele futuro sobre meu passado, eu vi. Ela sorria, e o meu tempo não passava. Ela acordava e ao vê-la, encontrava tudo que esperava. Anos foram na terra de Morfeu, enquanto só uma noite se esticava pelo meu relógio. Lembro como um sonho bom. E como todo bom sonho, a cada segundo desse alvorecer, menos lembro, e mais espaços brancos se somam à essa imagem dessa vida que tive. Ou que não tive. Sem abrir os olhos, busco remontar a foto, tento emoldurá-la na memória. Mas cada esforço se mostra em vão, enquanto cada olhar se desfaz, e cada beijo seca. Vejo-me dentro daquele retrato que derrete, e busco por ela. Aquela que deu a tudo o sentido que nunca encontrei. Como num corredor que nunca acaba, quanto mais eu corro, mais longe ela fica. O chão se abre e pareço cair dentro do nada. Não muito diferente do que foi realmente. Não muito diferente do que vi em minha mente. Mas assim “os sonhos cedem ante a impressão de um novo dia, da mesma forma que o brilho das estrelas cede à luz do sol.” E nessa manhã a luz me ofusca e apaga cada fragmento onírico que possa remanescer dentro de mim. De tudo que sei que sonhei. Lembro apenas de um momento. Lembro dos cabelos loiros refletindo a luz das chamas. Espalhados sobre meu peito. Sinto ainda o cheiro de jasmim e da vontade mútua do encontro. Os dedos entrelaçados e os olhos fechados. As velas iluminavam o quarto, e as pétalas brancas cobriam cada espaço. O resto todo não vejo. E o melhor é saber que lá o impossível aconteceu. Por isso quero voltar a dormir. Pois nada se pode cogitar de tão despropositado, de tão confuso ou surreal que não possamos sonhar. Sei que não é impossível, porque aconteceu uma vez. Mas o sonho bom acabou, e eu quero voltar a dormir. Só dormir... por mais cinco minutinhos...