Só por um minuto...
Uma prosa, um poema, uma crônica... mas só por um minuto.
sexta-feira, 23 de novembro de 2012
O Sábio
terça-feira, 29 de maio de 2012
Binômio
segunda-feira, 25 de julho de 2011
Espiando
sábado, 28 de maio de 2011
Afinal, quem sabe?

terça-feira, 29 de março de 2011
A longa espera
Ela estava lá sentada, com as pernas cruzadas, costas retas, queixo num perfeito ângulo reto e as mãos sobrepostas uma na outra no meio da coxa. Uma pose digna de foto e de fictícia nobreza. Entre os dedos duas guias laçadas atavam em suas pontas em cada uma um Schnauzer. Brincos pesados e colar de pérolas escurecidas adornavam a foto e combinavam bem com o casaquinho surrado de camurça, retratando alguma moda passada. Afora os cãezinhos pulantes à sua volta, ninguém mais ocupava o banco na praça. E ela parecia a espera de algo. Como se a certeza de um encontro furtivo a mantivesse ali, com firmeza. Muito era visível naquela cena, e nada fazia feliz. O tratar de seus animais de estimação como filhos, à chamados de “bebês” revelavam a falta de uma cabeça em seu leito pedindo cafuné. Seus filhos, se teve, já eram crescidos, e não davam mais bola pra ela. A companhia animal também fazia parecer não ter mais muitas amigas, e a pele envelhecida, cabelos afinados e grisalhos repintados, as rugas... isso só mostrava o quanto ela tinha passado daquele tempo. A marca forte em seu anelar esquerdo expunha a ausência de uma jóia de compromisso, e o traço triste sob as olheiras carregavam a viuvez. Mas ela continuava altiva. Ela continuava inchada. Via-se que a beleza uma vez esteve presente em sua face, mas não mais agora... não criava mais a mesma atração. Não duvido que ela sabia disso. E como sempre, as mãos revelam. Nós calejados e dobras malhadas contavam a história de um trabalho manual, e as marcas no dedão me faziam acreditar na agulha e na costura. Hoje ninguém mais precisa de alfaiate e costureira particular. Ali sobrava amor de mãe. Sobrava amor de amante. Sobrava conversa e trabalho. Só sobrava. Um olhar me Maria das Dores carregava a longa espera, e as longas mínguas. E tive dó. Senti a pena. Senti a lacuna criada pelo falecimento da juventude. Então não joguem fora as suas. Mesmo assim, talvez não seja possível entender o valor da juventude, pelo menos não até que ela se desfaça. Pelo menos não até que ela faleça. E eu já sei. Sei bem o que ela esperava encontrar. Ela estava ali sentada, com o espírito de uma criança, esperando pelo príncipe encantado montado no cavalo branco, trazendo o robe que lhe daria de novo a elasticidade. Ela estava à espera do amor que perdeu. Do filho que cresceu. Do valor que abafou. Do carinho que passou. Da amizade que se desfez. E de tudo aquilo que aquelas pérolas me contam que um dia viram. Ela foi feliz! Cada brilho do anel grita, “eu fui feliz e vi o mar”! E mesmo que tenha agora que aguardar pela próxima vida, e uma nova chance de ser completa novamente, ela vai esperar. Vai sim. Porque aquela alma sabe o quanto vale ser feliz.
quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011
Personagens num bar
São vários, os boêmios. Cada um tem seu tipo, mas são todos iguais. Iguais pelo menos no amor pela noite, na companhia da cachaça, nos jogos de azar e na divisão da fumaça. Todo boteco tem um dono, também quase sempre um patuscão, que conhece bem a freguesia e lida à força, e não com educação. Sempre tem um dormindo na mesa de canto, enquanto outro lhe tira a carteira, com a maior cara de santo. Ele dorme pois não agüenta mais o gole, não tem mais dinheiro, nem mais jeito de alimentar sua prole. Enquanto um galã xaveca uma mulher honesta, outro, cambaleando, é tirado pela porta. Para ele acabou a festa. Quem sabe beber, sabe, quem não sabe, não se comporta. E é por isso que aquele dorme. É por isso que quem der bobeira some. Metade não paga a conta, outra metade faz o que pode, e é só a terceira metade que realmente consegue patrocinar o pagode. Mulheres vão à caça vestidas de carneiro, e o lobo sai pagando por tudo, todo faceiro. O artista do submundo se expressa, mas sem aplausos, só é musica de fundo. A cada nota torta do violão uma palavra grossa de mais alguém que foi ao chão. Um sobe sobre a mesa e leva um tapa. Já é de manhã e alguém sai à comprar pão, outro acaba cerveja, mas é cedo, e pede outra lata. Três amigos conversam, dois amigos apostam, um sozinho fica de olho, e dois inimigos se arriscam. Garrafada pra todo lado. Fim da noite com briga. Fim da noite, nossa amiga. Quebram uma mesa, e os copos são vários. Um puxa o gatilho, e corpos, esses também são vários...
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
E assim, Tadeu...
- Vai querida, respira, comigo, vamos!
Ela:
- AHHHH, que doooor, assim eu não agüento, não quero mais, eu não consigo!
- Não pode ser assim, “agora não brinco mais”, agora não tem jeito.
- Dói muito! Não dá! Não vai passar!
- Meu amor, você consegue sim, empurra, comigo, no três; Um.
- Fácil falar né seu inútil, ta aí só olhando.
- Dois...
- Pare de contar seu bosta, não está ajudando!
- Três! Empurra!
- Vou te empurrar pra fora dessa sala! O obstetra nem chegou ainda!
- Amor, eu to nervoso, ok?
- Eu estou com um ser vindo de dentro de mim me rasgando de baixo pra cima, e o senhor está nevosinho? Aff, por favor... AAAAAHHH!
- Essas contrações são de matar – ela ofegando fortemente.
- Tem algo que eu possa fazer para ajudar?
- CALA A BOCA E CHAMA A ENFERMEIRA!
- Nossa... então é assim... depois reclama que eu não colaboro...
- Aaaaaaaaaaaiiiiii!!! Meu Deus, o que é isso?! ai ai ai ai... ta vindo, chama lá, CHAMA LÁ PORRA!!!!
- Uau, nunca vi você falando assim enh... o que uma barriguinha não faz...
- AAAAAAAAAAAHHHH!!
- Ta bom, ta bom, pelo jeito está doendo, já entendi, saquei, não sou tão tapado assim só porque sou homem, tá? Vou lá chamar...
Um Doutor correndo no corredor com cheiro de malte e olhos baixos:
- Sim, o que foi? Hic (soluço).
Ele:
- Doutor, minha mulher está tendo um bebê, acho que está vindo, precisamos do senhor.
- Senhor está no céu meu filho, hic, eu to aqui no chão mesmo e meu horário já terminou, hic, até mais...
- Mas eu não sei o que fazer! Ela está lá gritando de dor.
- Hic, todas gritam... hic... é só o que sabem fazer. A minha mulher estava gritando comigo agora mesmo no telefone.
- DOUTOR! Estou falando sério, ela está em trabalho de parto!
- Hic, sim, sim, elas são um parto... quer um trago? Hic – virando mais um gole.
- Não, obrigado.
- É 12 anos... vai te relaxar... hic....
- Sério? Aceito então! – ele toma um trago.
15 minutos e várias doses depois... ele, entrando na sala:
- Amoooor, hic, olha quem eu achei no corredooooor! Dr. Roberto! O cara é muuuito gente fina.
- Ricardo, você está BÊBADO, seu desgraçado?!
- Nããão, claro que não, amor... hic... – ele virá para o médico e diz sussurrando, porém em voz alta:
- Ixi doutor, acho que ela sacou... hic...
- É filho, essa sua aí é esperta... mas sabe, você é um cara da paz, te considero muito!
- Ôô doutor, eu também! Temos que marcar um bar aí um dia, de repente jogar um futebolzinho...
Ela interrompe:
- ALOOOOU! Eu to tendo um filho aqui!!! Dá licença?? AAAAH!
- Ah, sim, claro, filho, chame a enfermeira ruiva ali para mim, sim?
- Hic, ruiva?
- Sim, a loira é cheia de não me toque, hic. – o médico vira para a mamãe - Então Sra., parece que vamos ter uma criança aqui! Hic...
Entre contratempos e soluços, a criança vem à luz, e a mãe suada e exaurida a recebe no colo:
- Ai meu Deus, obrigado, ele é tão lindo! Ainda bem que não parece com o pai!
- Como assim querida? Deixe-me ver, hic. Ah, mas é bonitinho mesmo, não é?
- BONITINHO???
- Quero dizer, é a coisa mais linda que, hic, eu já vi! Viu aqui doutor? Meu piazão? Esse aqui vai ser pegador! Ó o tamanho da ferramenta aqui! Puxou o pai!
- Ricardo, cala a boca... como assim “coisa” mais linda? Seu inútil. E se puxar essa merreca aí, é melhor ser rico, senão aí sim vai acabar que nem o pai...
- Ei, não precisa, hic, ofender não...
Indignada com a situação e espumando de raiva ela decide:
- Eu vou escolher o nome!
- Ei, mas a gente já não tinha escolhido Carlos? Carlos é uma boa, hic, não é “dóc”?
Doutor:
- Sim, eu gosto...
Ela:
- Não, você escolheu Carlos, eu quero Lucas.
- Aaah não, querida, nome bíblico não...
- Por que, qual o problema?
- Não quero, não gosto, não vou chamar, você vai chamar, hic, sozinha. Só você...
- Então será Rafael!
- Ah amor, mas aí quando ele for pequenininho vão ficar falando, hic, Rafael cara de pastel, crianças odeiam isso, você sabe.
- Ah, mas que coisa mais besta, Ricardo!
- Não querida, eu não vou chamar de Rafael. Hic...
13 nomes depois, discussão e mais uns soluços ébrios. Ela se cansa:
- Tá, deu então! Pra mim chega. Depois a gente vê isso, quando você estiver sóbrio.
- Tá, deu?
- Isso, chega!
- Tadeu é bom.
- Chega Ricardo, quero acabar a discussão.
- Não, não, querida, Tadeu é um bom nome, meu tio avô era Tadeu, eu gostava muito dele, ele me dava uns biscoitos que...
- O quê? Do que você está falando?
- Ueh, você não sugeriu Tadeu? Eu gostei, fica esse.
- Hã?
- Você acabou de falar, mulher! “Tadeu e chega”.
- Meu Senhor, Ricardo, como você é IMBECIL! Mas... sabe... gostei de Tadeu! =D
E assim, Tadeu...